terça-feira, outubro 23, 2007

"Parto contigo..."


Às vezes custa-me tanto
os teus olhos, murmúrio-grito
de um infinito impossível.
A.M.

Não me perguntes porque fico
De repente parto fundo nas tuas costas
O sangue e o tempo
E o tempo e a pele
De repente as sombras nas tuas costas
O relento aceso
O peito de mel

Não me perguntes porque fico
Pede-me lá isso e não me deixes
ver o quê.
A mão no sexo, a casa em branco
Não me perguntes se existo
Se por dentro dei-te e
tanto.

Não me perguntes quem sou
Vem agora que é amor
De resto a dor inventa o que
não houver.
Vem agora que é maior
O que não pode permanecer.

C.


terça-feira, outubro 09, 2007

O que se deixa acontecer.

É demais o mundo à espera de decisão. O nosso poder contextualizado numa sociedade que arrefece os dias vendendo a ideia barata de que os fogões já fazem tudo sozinhos e as famílias mais felizes. Junta-se o ócio do sistema à procura de solução sem sair da secretária. As gentes protestando lá fora, do outro lado do vidro duplo, ou triplo, e da muralha ruidosa que se perde no asfalto. Bactérias sexagenárias ainda espreitam à mercê dos mais fracos vincando os espaços editoriais. Ou do país. O péssimo uso do poder que se impõe em liberdade disfarçada, na hipocrisia de esquinas que todos fingimos não perceber.
Discute-se ao jantar o estado do jornalismo em Portugal, puro tempo estendido ao tecto. A roupa entra na máquina para lavar quando está suja e quando, por engano, se juntam cores, não há nada que remova o que tingiu o quê. Atrapalha-se o garrido como a verdade, o fundo da questão cada vez mais incongruente e fugaz.
Parem para pensar sozinhos. A primazia passa agora por direccionar o caminho que já corre nos temperos da sociedade, fugindo ao comodismo de ficar a debater e magicar qual será a solução. Solução do quê? Nada está errado porque nunca esteve certo. O caminho é este e já não há volta a dar. A dificuldade reside agora em adaptar o ontem ao desconhecido e andar para a frente, tentar sobreviver nesta selva indefinida com nuances deslumbrantes. O país já não é o mesmo, o tempo também não. Mas foi o ciclo que deixámos acontecer e com o qual temos de aprender a lidar, ao invés de continuarmos presos à ilusão de que o carro voltará a ser carroça.

segunda-feira, outubro 01, 2007

Ser-se só



Mafalda Veiga & João Pedro Pais. Sublime. Em cada sopro um poema que me fez parar e pensar em tanta coisa. Que ando tão longe do amor como da escrita, esse espaço que urge em cada tombo dilacerado. Os vinte mil caracteres diários que se me impõem não bastam à sofreguidão do tempo. Passam-se vidas sobre as semanas, olhos do tempo apagado nos dedos. De repente sei que a vida não é fácil e eu talvez a queira assim. De repente sei ser só e vou-me encontrando no caminho que não sei se escolhi ou me aconteceu.
Quero lá saber. Tenho o poder de tornar diminuta a dor. Esta faca que hoje me amanheceu o peito e que vejo sangrar dentro de ti. Quero lá saber. Quero um dia diferente amanhã ou o mesmo de há dois anos. Chove e eu devoro a solidão. Ontem um amigo meu dizia-me das coisas mais belas que alguma vez alguém me possa ter dito: "Adoro ter mil convites e poder recusar, ficar só e isso saber-me tão bem. E quando penso em estar só, penso em estar contigo. E estou. Fazes parte da minha solidão".

.

"Põe o teu corpo bem junto do meu,

uma voz escondida disse "eu, sou eu..."

Cuida de mim, traz-me aconchego...

...tenho frio.

Quero sair

Leva-me para um lugar que nunca ninguém viu..."

MV&JP