terça-feira, maio 31, 2005

Razão

(...)
Não te daria o que dou
Se me desse por inteiro

Só espero que tu entendas
Que prefiro que me deixes
A deixar que tu me prendas


Bem sei que é contradição

Eu pedir-te Liberdade

Sabendo que a condição

É ficar preso à saudade...

Camané

sábado, maio 28, 2005

Porque vim


Medo de me entornar nas escadas
E de forças trocadas
Não te saber escrever.


Quase sisma, quase nada
De voz distante, o timbre aqui
Tantas rosas pelas jarras
amarrotadas
Amanhã saudade
Foi no nada que vim.






E de repente eras só
Tudo mais longe
Um desvio ao engano
Porque a mentira não foge


E de repente eras
As noites caladas
Como quem cruza depressa
Canções recortadas.



E quando os teus olhos não acabam
No medo
Enquanto os dedos se desviam
Te espalham em segredo...
Foi pelo tudo que vim.
C.

sábado, maio 21, 2005

Algarve

"...no ar o cheiro do destino,

no chão a pele quente do Algarve

a acordar..."

P.A.

sexta-feira, maio 20, 2005

...

Pauta


Ficas a arder-me nas nódoas que não escrevo
Não tenho nada a dizer
A mais esguia das palavras como sangue
Aos pontapés, em contra mão.
Um abraço que me chame
Que me amarre ao anoitecer.



Fico a querer-te, como rasgos,
desvios
Sempre a esquecer-te
Dentro dos rios.



Fico a enlouquecer-me na escuridão
A vendar os fantasmas docentes
Como ignorantes vadios
Que me impedem o teu perdão.



Fico, sem morrer de mim
Sem querer, porque vim
Agreste na mágoa e sozinha
Como gritos de acordes
Em que a pauta sou eu
Ou som que dela

se extermina

C.

terça-feira, maio 17, 2005

Melómana

Uma cidade pode ser
apenas um rio, uma torre, uma rua
com varandas de sal gerânicos
de espuma (...)

Uma cidade
pode ser o nome
dum país, dum cais, um porto, um barco
de andorinhas e gaivotas
ancoradas
na areia. E pode
ser
um arco-íris à janela, um manjerico
de sol, um beijo
de magnólias
ao crepúsculo, um balão
aceso
numa noite
de Junho
Uma cidade pode ser
um coração,
um punho.
Albano Martins
in "Ao Porto"



Escutamos o Porto: os passos dados sobre as lajes; vozes soltas, feridas; falas num português perdido (...) Vamos atentos à solidão das pedras (...) e o rio resume tudo isto...

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Gastão Cruz

in "Ao Porto"

O choro é sempre um lugar incerto

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O que aqui se dá a ver é o nosso medo...

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Tenho medo

Tenho sempre medo:

nem a palavra que dizemos com voz baixa nos acompanha

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Rui Nunes

Frases retiradas de um texto referente à exposição de Paulo Nozolino a decorrer na Fundação de Serralves até dia 10/6

segunda-feira, maio 09, 2005

Para sempre

Madrugada, como sempre. Como o hoje permite. Advém da vontade uma igual sensação de presença constante e inatingível que cruzo sempre que as mãos se choram e os corpos insistem, na penumbra, o arauto destes dias tão sós. Doce. Largo sorriso escrito na inefável expressão da incerteza, feliz, agreste, que está. Há dias escrevia sem perceber como eram possíveis as palavras em mim e os beijos no chão, como se de uma quimera se tratasse. Porque também das quimeras tratam as palavras ou esta incapacidade de sons que tento cumprir quase mecanicamente em função do "heart beat". Sombras. Imensas, arfando os passos que não reduzo ao círculo do tempo. Falam e gritam o que não sabem dizer e eu finjo que não escuto as peles, diversas, que acabam, contudo, por me ensinar a vestir-me. Hoje eu, amanhã o talvez. Hoje tu, porque ele assim o permite.
Tu, como sempre, como nunca mais.



"Transfigurava o tempo (...)

Todas as marcas onde algo de seu ficará

para sempre..."

sábado, maio 07, 2005

Vigílias


A escrita é a minha primeira morada de silêncio
A segunda irrompe do corpo movendo-se por trás das palaras
extensas praias vazias onde o mar nunca chegou
decerto onde os dedos murmuram o último crime
escrevo-te continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas paredes de nada.




Esta paixão pelos objectos que guardaste
esta pele-memória exalando não sei que desastre
a língua de limos
Espalhávamos sementes de cicutu pelo nevoeiro dos sonhos
as manhãs chegavam como um gemido estelar
e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar
Outros corpos de salsugem atravessam o silêncio
desta morada erguida na precária saliva do crepúsculo.
Al Berto
in
Vigílias

segunda-feira, maio 02, 2005

Cinzas

Saudade




Espero por ti no fundo do mundo.
Ou no principio dele,
Enquanto as sementes secam ao sol
Que não nasce.
E as palavras se perdem
num verso sem peso nem medida.


És o que não chega
Promessa do amor que enche
Os espelhos, brilho
Da treva que assombra
O cristal.


E quando olho pela janela,
Como se viesses do fundo da rua,
Só a tarde dobra essa esquina
Que te viu partir
Com os olhos húmidos da manhã nua.


Sombras cinzas e ruína
Chegam em cada Primavera; mas tu
Só voltas de onde não sei,
Quando não espero
E onde não estou.


Nuno Judice

O movimento do mundo