terça-feira, junho 28, 2005

Não venhas...

Francesca Womman

Não venhas sentar-te à minha frente, nem a meu lado;

Não venhas falar, nem sorrir.

Estou cansado de tudo, estou cansado,

Quero só dormir.

Dormir até acordado, sonhando

Ou até sem sonhar,

Mas envolto num vago abandono brando

A não ter que pensar.

Nunca soube querer, nunca soube sentir, até

Pensar não foi certo em mim.

Deitei fora entre urtigas o que era a minha fé,

Escrevi numa página em branco, "Fim".

As princesas incógnitas ficaram desconhecidas,

Os tronos prometidos não tiveram carpinteiro.

Acumulei em mim um milhão difuso de vidas,

Mas nunca encontrei parceiro.


Por isso, se vieres, não te sentes a meu lado, nem fales.

Só quero dormir, uma morte que seja

Uma coisa que me não rale nem com que tu te rales -

Que ninguém deseja nem não deseja.

Pus o meu Deus no prego.

Embrulhei em papel pardo

As esperanças e ambições que tive,

E hoje sou apenas um suicídio tardo,

Um desejo de dormir que ainda vive.


Mas dormir a valer, sem dignificação nenhuma,

Como um barco abandonado,

Que naufraga sozinho entre as trevas e a bruma

Sem se lhe saber o passado.

E o comandante do navio que segue deveras

Entrevê na distância do mar fim do último representante das galeras,

Que não sabia nadar.

Fernando Pessoa

segunda-feira, junho 27, 2005

Picture of My Own


even i don't understand what i'm here for
even i don't comprehend, i need more
even i just don't know why i cry these tears
even i, even i...don't dare to ask why


Save me
from this sadness it's coming
or take me
before my smile it's dissolving
wake me
from this nightmare i'm entering
don't let me fall in the corners of my own
As a tear comes from inside

I feel like i'm gonna drown
and as i'm searching for something to occupy my mind again
I lay
Down on my bed
But then a picture of my soul shows me
there's no way instead
touch me

make me feel i'm alive
or forgget me
maybe i would die with time
love me
all i need is a hug
embrace me
'cause times are going too rough
and as i think i'm lost nowhere

i find where i am all alone
and as i'm desperating slowly just looking
at my night without stars
i pray
that someone could call
but then a picture of my own
tells me i'm made to fall
and it's a picture of my own

a picture of my own
a picture of my own
that's making me feel this way
and i'm so sorry babe
it's all so silent here
up here
here,
here...



sábado, junho 25, 2005

Quanto tempo levas?

A alguém que tem tanto de mim, ao me dar tão pouco...

Quanto tempo passa,
Quanto tempo tenho,
Quanto tempo fica p´ra te dar.
Quanto tempo vais,
Quanto tempo ficas longe,
Quanto tempo tenho para te dar mais?
Por quanto tempo partes,
Quanto tempo levas,
Quanto tempo deixas o teu corpo em mim?
Quanto tempo pedes,
Quanto tempo guardas,
Quanto tempo temos quando o tempo chega ao fim?

Pedro Abrunhosa

quarta-feira, junho 22, 2005

S.João @ Porto

A um qualquer arco-íris,




Anterior ao tempo
O olhar pálido repetente dos dias festivos.
As mãos calvas, vazias
Quando à noite aconteciamos
É passado.

Anterior às tuas lágrimas
Madrugadas a fio, segredos
Os teus dedos.
Antes do tempo ou o tempo
preso a nós.

De ti o através de dor
de mim o passo no fundo
Agora é a tua mão que escrevo
E viajo, e insisto
Ao redor do nosso mundo.

--,-<@

domingo, junho 19, 2005

"O" Poema...

À espera de um poema...

.

.

Toda a noite à espera de um poema,

uma frase, uma palavra,

uma voz que enchesse

os vários silêncios

que acodem sempre ao final do dia…

Toda a noite à espera de um poema

enquanto o olhar se perdia

à procura de uma sílaba, um ditongo,

uma aliteração forçada, uma rima inexistente…

Toda a noite…

A noite é sempre pouca para ocupar o silêncio de um olhar.

.

.

.

Sistermoonshine

sexta-feira, junho 17, 2005

Fingir que está tudo bem

Fingir que está tudo bem:
o corpo rasgado e vestido com roupa passada a ferro, rastos de chamas dentro do corpo, gritos desesperados sob as conversas:
Fingir que está tudo bem: olhas-me e só tu sabes: na rua onde os nossos olhares se encontram é noite: as pessoas não imaginam: são tão ridículas as pessoas, tão desprezíveis: as pessoas falam e não imaginam: nós olhamo-nos:
Fingir que está tudo bem: o sangue a ferver sob a pele igual aos dias antes de tudo, tempestades de medo nos lábios a sorrir: será que vou morrer?, pergunto dentro de mim: será que vou morrer?, olhas-me e só tu sabes: ferros em brasa, fogo, silêncio e chuva que não se pode dizer: amor e morte:
Fingir que está tudo bem: ter de sorrir: um oceano que nos queima, um incêndio que nos afoga.
Auschwitz - Birkenau
Agosto @ 04




a tua ausência é. em cada momento, a tua ausência. não esqueço que os teus lábios existem longe de mim, aqui há casas vazias. há cidades desertas. há lugares.
mas eu lembro que o tempo é outra coisa, e tenho tanta pena de perder um instante dos teus cabelos.
aqui não há palavras. há a tua ausência. há o medo sem os teus lábios, sem os teus cabelos. fecho os olhos para te ver e para não chorar.
José Luis Peixoto

quinta-feira, junho 16, 2005

Uma força

Havia um rosto, de velho, de lágrimas galopantes que tentava saltar a cerca do jardim para o meu lado – via-se melhor. Num apertão de alma fui ao seu encontro e tentei segurar-lhe a dor por mais um instante, mas as pernas já sem movimento e a bengala viajante impediram-no de ver tudo mais de perto. Desapareceu dos meus olhos.

Passava das cinco da tarde, quando a multidão se cruzou com o céu, ou o céu com a voz, não sei. Foi impressionante. Uma união digna de um Homem do qual não vou falar aqui, as biografias ficam para depois, como ele assim o queria. Falar-lhe em fazer uma biografia, seria falar-lhe da morte e hoje, naquele mar de gente, falou-se de Álvaro Cunhal como nenhuma outra voz que não a deste povo jamais o saberá fazer tão bem.

Não quero deste texto o carácter noticioso, as notícias deste tema estão gastas, enroladas no fio da actualidade que se prende ao contexto da notícia que sucede a notícia. E a notícia é a morte. Quero a reportagem, livre e concisa do que foram os rostos, as bandeiras, os olhares, os hinos perdidos em tantos os cravos como a força da união. Quero rasgar esta pele jornalística que me persegue e me obriga a misturar-me com tudo o que “acontece” e escrever, e sentir, na louca solidão quase obsessiva de observar até o alcatrão da estrada coberta.

Independentemente da cor, do contexto, do tamanho ou do feitio, mas não independente da coerência admirada por tantos, ecoa dentro de cada um de nós a certeza de que há ainda uma força presa à luz derramada. Ainda há "gentes" que vibram, que suam, que chamam...
Quem esteve presente nesta despedida de hoje sentiu terminantemente o que é difícil reportar aqui na perfeição – ou não fosse o real indelével.
O velho surgiu a meu lado.

“A luta continua…”

“Até amanhã, Camarada.”

segunda-feira, junho 13, 2005

Eugénio

Adeus, Poeta

Não sei falar dos teus olhos senão chorando-te enquanto te despedes nas palavras que não mais sairão de ti. Paralela ao mundo que ziguezagueia o teu nome em toda a parte, procuro nos meus poemas todos os teus traços que bebi desde que contigo me cruzei.

Uma pausa, em silêncio, lembrando os momentos que não fomos e o arrependimento não sei de quê. Talvez da rosa que hoje não beijo sobre ti, talvez do amor que tão bem escreves - escrevias - à riqueza da simplicidade que mora contigo.

Pai dos meus versos, porque todos nós somos fruto das nossas referências, dos nossos heróis. E talvez Adeus, com dor, porque apesar das palavras que ficam, não mais a caneta se erguerá nos teus dedos pousados.

.

.

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Adeus
Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chegapara afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquina
sem esperas inúteis.
Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu ladotodas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olho
seram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certezade que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nomeno silêncio do meu coração.N
ão temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus.
Eugénio de Andrade

sábado, junho 11, 2005

A um dia sucede outro dia

Roda da sorte

Como num túnel, sem ver luz ao fundo,
As pessoas vagueiam, perdidas do mundo.
Todas dependem da roda da sorte
E todas oscilam entre a vida e a morte.
Hoje no céu, amanhã no inferno,
O que parece ser Verão, torna-se Inverno.
Ao almoço tremoço, caviar ao jantar,
O destino é instável como uma folha no ar.
Paulo Abrunhosa
in
"Diário de um Dromedário"


Na cidade

uma torre

de granito

Na rua

a um dia

sucede outro dia

Pela tarde

os sinos

trá-los o vento ao sotão

lembram

as horas que passam

toda a solidão do mundo

João Pedro Mésseder

"Lapa, à hora dos funerais"

quinta-feira, junho 09, 2005

Sobre ti

À Xana,

Nada mais do que isto,

E tudo isto sobre ti...

terça-feira, junho 07, 2005

Nem sempre

Nem sempre nos sobra a luz dos passos que damos. Talvez nos beije mais quotidianamente o nada que fere.
E hoje, o que me resta?





Luz agonizante

Luz a mais nesta noite caiada de subúrbio
Luz paralela quando as pálpebras te pensam
É assim que me morre toda a poesia.


Ao partir de mim, do vento
Para este tormento de papel
Luz tragada, todo o passo é de cor
Luz cansada, quando dizes ferro e dor.


Tanto por percorrer
E as noites são assim
Quando a vigília faz tortura
Todos os contornos em mim.


Corpos que trago em bandejas
E sirvo-me com rancor
Corpos de ira, sem amor
Imagens,
Imagens,
Imagens…


Perco tudo
A luz, luz distante
Quanto ao resto, protesto
Não é só o estar que permanece
O meu tempo demais, por ti
No cigarro que arrefece
Ou dentro dele quem não vivi.

C.

sexta-feira, junho 03, 2005

Ser a Amizade

A quem se espelha nestas imagens e me deixou hoje este poema tatuado, como se os seus olhos o tivessem escrito,
*You know why*

Ás vezes falta-me, não sei
Versos que liguem as palavras que me escorrem
Rasgos de cor
Bem vestidos
Da cumplicidade à ferrugem.

Faltam-me
Folhas brancas, em branco
Não sei,
Se é de ti que nascem as sombras
E tudo aquilo
Que chorei.

Às vezes gostava de sentir
Os poemas a arder
Dentro de ti em que o beijo
Se espalha para não ser.


Restauro os momentos de ausência
O vazio
Quem eras…
Quando os puzzles montavam cinzas
E me cobriam do frio.


Podes estar aqui, ali,
Volto a não saber
Podes ser quem
Me falta trazer
Pelas ruas percorridas
Peitos enxugados nas mentiras
À vertigem do prazer.


Acho que me falta a solidão
Como voz humana
Pensar a dor tendo-te na mão
Fugir-te como quem chama.

C.